O que The White Lotus, The Last of Us e Ruptura têm em comum?
- Antony Eduardo
- 23 de abr.
- 4 min de leitura
Atualizado: 1 de mai.
Um breve comentário sobre o papel dos lançamentos semanais na transição da televisão para as plataformas de streaming.
Além de números, sucesso colossal com o público ao longo dos últimos anos e serem reconhecidas pelo longo tempo de espera no intervalo entre temporadas, títulos como esses resgatam um hábito que estava quase esquecido: esperar pelo próximo episódio. Numa realidade onde observamos mais e mais estratégias adquiridas pelas plataformas ao lidarem com o lançamento e distribuição de seus projetos, campanhas de marketing passaram a ser peças fundamentais no processo de lançamento de uma obra. Das ecobags azuis aos pontos de ativações espalhados ao redor das cidades, o que leva uma plataforma a lançar seu conteúdo de forma periodizada?
Em épocas mais simples, paciência era um requisito fundamental no universo audiovisual. Dos cinemas ao blockbuster, o simples ato de adquirir um DVD ou fita cassete e assisti-lo no conforto de sua sala foi completamente transformado com a revolução e transição da televisão para a internet, que antes de proporcionar todas as possibilidades do streaming, entrou na jogada audiovisual de maneira gradual, operando aos poucos na digitalização desses mesmos conteúdos e na forma com que nos relacionamos com eles.
Afinal, quem nunca se pegou contando os dias para o lançamento daquele filme ou exibição de um episódio especial de uma série aguardada na televisão?

A terceira temporada do sucesso da MAX, The White Lotus, tem conquistado o público semanalmente. Foto: divulgação
Com o passar dos anos, junto a todos os avanços tecnológicos e a conveniência das redes sociais, principalmente após uma quarentena, o ato de acompanhar os desdobramentos de todo o processo de produção das obras audiovisuais tornou-se cada vez mais comum. Do fancast à escolha oficial do elenco, da pré-produção ao início das gravações e tratamento final do produto, tudo isso nos leva até uma das principais etapas de uma obra: seu lançamento.
Se antes os filmes e séries dependiam exclusivamente primeiro de seu lançamento nos cinemas, VHS, DVD’s ou espaço na grade horária de alguma emissora — aberta ou a cabo —, hoje esses mesmos produtos chegam à tela de sua preferência em apenas algumas semanas após serem lançados ao mundo, por meios legais ou não. A plataformização desses conteúdos, de certa forma, fez com que se abrisse os olhos para o potencial que as mídias digitais possuem ao mercantilizar a presença dos conteúdos audiovisuais, não somente os restringindo, mas transformando também as formas de acesso a eles.
Acompanhado da chegada do streaming on demand, que ressalta o avanço e o diferencial na maneira em que consumimos conteúdos — permitindo assistir seja qual for o conteúdo, onde e quando quisermos —, vemos surgir também as noções críticas a respeito desses conteúdos e da forma com que são distribuídos digitalmente. A pesquisadora Melina Meimaridis trabalha em alguns textos acerca dos sentidos por trás de um fator bastante popular, o binge-watching, que nada mais é do que o consumo excessivo, apressado e até performático das produções seriadas. Esse fenômeno, ainda que não possua um vínculo originário com o streaming, encontrou nessas plataformas sua consolidação.
Se a cada temporada nova surge a possibilidade de uma maratona, assim como em uma corrida, parece tentadora a ideia de consumir todos os episódios de uma vez, ao mesmo tempo em que se foge do tradicional e antigo padrão de assistir esses conteúdos de forma semanal, ou até mesmo da emoção diária adquirida ao acompanhar uma telenovela. O lançamento de séries com episódios distribuídos semanalmente entram na jogada talvez como uma estratégia para manter a atenção do público por mais tempo acerca de um episódio individual, mas além disso, aumenta também a expectativa dos espectadores para os próximos episódios, resgatando minimamente um aspecto que pode ter se perdido no streaming, a afetividade coletiva no ato de assistir uma produção, influenciando diretamente no interesse do público em consumir conteúdos derivados desse mesmo produto por muito mais tempo.
Conseguimos observar esse fenômeno na prática ao analisar os projetos de maior impacto de algumas dos gigantes do streaming, responsáveis pela manutenção de todo o ritmo de consumo e detentores dos mais diversos estilos de simulação ficcional propostas pelas séries atualmente.
Em um cenário onde dezenas de produções são lançadas semanalmente, todos os meses e nas mais diversas plataformas, a série com mais prêmios na história do Emmy Awards, Game of Thrones, teve seus 73 episódios exibidos semanalmente pela HBO, muito antes da famosa MAX (plataforma de streaming da HBO), em uma época em que após a exibição, os episódios eram disponibilizados no HBO GO, aplicativo destinado exclusivamente a usuários assinantes do canal pago. Cada plataforma escolhe e adapta sua lógica de distribuição, visando objetivos e estratégias específicas para manter a atenção do público e aumentar cada vez mais os números de alcance com suas produções.
A Netflix, por exemplo, costuma diversificar sua distribuição, mas a respeito dos conteúdos originais que produz, deposita suas fichas em um formato híbrido, não totalmente semanal, mas de forma repartida, em que os episódios são lançados com um intervalo de tempo maior. A grande aposta da norte-americana para o ano de 2025 é o lançamento da quinta e última temporada do sucesso Stranger Things. O projeto iniciado em 2016 é responsável por grandes conquistas da empresa no que diz respeito a números e alcance, mas também ajudou a consolidar de vez a tendência de lançamentos de outros grandes projetos da plataforma através de lançamentos em volumes. Dessa forma, a empresa enxergou a possibilidade de não se restringir apenas à data de lançamento dos conteúdos para trabalhar em torno deles, assim, grande parte da divulgação publicitária de um projeto vai girar em torno de apenas uma parte de seus episódios, que vão ao ar na plataforma antes mesmo do volume final ser lançado, trabalhando em volta de toda a construção de expectativa e experiência dos assinantes, ao transformar cada lançamento em um evento.
Da mesma forma, tanto a Max quanto a Apple TV vem se evidenciando cada vez mais dentro do lançamento de obras distribuídas semanalmente; a distribuição nesses casos funciona muito bem como forma de destacar cada episódio como parte fundamental de um todo, valorizando a construção total de uma boa obra. Títulos como The White Lotus, The Last of Us e Ruptura são alguns dos shows que renovaram seus episódios em 2025 e colecionam milhares de espectadores nas redes mesmo após o fim das temporadas, o que, a longo prazo, vai se tornar fundamental para a longevidade das séries nas plataformas.
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