Dandismo negro, alfaiataria e elegância no Met Gala 2025
- Júlia Carla
- 1 de mai.
- 5 min de leitura
Atualizado: 30 de mai.
Todos os anos um dos eventos mais aguardados é o Met Gala. A primeira segunda-feira de maio é sempre esperada com ansiedade e expectativa por aqueles que são amantes da moda. Este ano, o evento surpreende com o tema Superfine: Tailoring Black Style; em tradução livre, Impecável: Moldando o Estilo Negro.
Dessa vez, o baile terá como dress code a proposta Tailored to You, que celebra a alfaiataria como expressão de individualidade. É esperado que os convidados explorem silhuetas únicas, cortes personalizados e interpretações criativas da moda sob medida. A alfaiataria, com sua tradição de elegância, deve aparecer reinventada nesta grande noite, refletindo estilos pessoais e narrativas visuais que dialogam tanto com o passado quanto com as estéticas contemporâneas.

Fotos: Tyler Mitchell para GQ e Vogue / Distribuição
Os coanfitriões da edição serão Lewis Hamilton, Pharrell Williams, A$AP Rocky e Colman Domingo, tendo LeBron James como presidente honorário, ao lado da anfitriã, Anna Wintour. Após 21 anos, a moda masculina volta a ser o foco do evento, desde 2003, quando ocorreu a exposição Bravehearts: Men in Skirts.
O Met Gala é sinônimo de importância no universo da moda desde 1979, sediado anualmente no Museu Metropolitano de Arte, em Nova York. Com a participação de diversas celebridades que desfilam em trajes criativos e elegantes sobre o famigerado tapete vermelho, o evento tem como objetivo arrecadar fundos para o museu, além de promover a exposição de primavera.
Inspirado pelo livro Slaves to Fashion: Black Dandyism and the Styling of Black Diasporic Identity, da autora e professora Monica L. Miller, o tema deste ano se baseia nas fotografias e vestimentas presentes na obra, que aborda o estilo dos homens negros e a figura do dândi negro através dos séculos.
O termo “dândi” (dandy) surgiu na Europa no século XVIII e descreve homens ligados à estética e à moda, representando também a atitude sofisticada e independente. No contexto negro, o dandismo surge a partir da diáspora africana, utilizado por ex-escravizados como um forma de apropriação para ressignificar sua identidade e desafiar estereótipos raciais.
Como uma forma de resistência e estética que vai além do simples estilo, o dandismo negro se constitui enquanto um movimento cultural potente: a elegância e a estética se tornam formas de reafirmação da negritude, de empoderamento e de liberdade. "Moda, roupas, estilo e dandismo, em particular, têm sido usados pelos negros como uma ferramenta. Às vezes, para enfrentar realidades difíceis, mas também para transcender essas realidades, para alcançar a alegria, para se definir, tanto quanto possível”, explica a curadora da exposição, Mônica L. Miller, para o jornal francês Le Délit.
Desde a origem até os dias atuais, o dandismo negro se faz presente na moda masculina e durante os últimos anos passou por um tipo de renascimento, impulsionado por designers e celebridades que trouxeram outra roupagem ao conceito e influenciaram na criação de tendências.
Ao pensar esse estilo ao longo das décadas, é impossível não citar Dapper Dan, responsável por levar a alta costura ao movimento hip-hop nas décadas de 1980 e 1990. O estilista exerceu influência direta no streetwear, unificando grandes marcas e grifes com o estilo urbano do Harlem, seu bairro de origem. Rappers, atletas e outras celebridades negras usaram seus designers e espalharam a tendência da logomania pela comunidade negra norte-americana.
Outro grande nome que incorporava a moda dandista nos anos 80 e 90 foi André Leon Talley, ex-diretor criativo da Vogue e o primeiro negro a ocupar esse cargo. O trabalho do jornalista foi um marco na história da moda ao combinar o estilo dândi com elementos contemporâneos e extravagantes, por meio de sobreposições marcantes e, claro, sempre elegantes. Além disso, Talley foi um grande ator na participação e incorporação de designers e modelos negros em desfiles e capas de revistas.
A aproximação entre a moda e a comunidade negra norte-americana consolidou a presença de uma estética dândi ressignificada, mesclando referências clássicas com elementos da moda contemporânea e da cultura negra. Nomes como Little Richard, Prince, Bootsy Collins, Lenny Kravitz, André 3000 e Billy Porter incorporaram esse estilo em suas trajetórias visuais. Essa influência se estende também aos dias atuais, com iniciativas autorais, como a marca Golf Le Fleur, do cantor Tyler, The Creator, e ao reconhecimento institucional, com Pharrell Williams à frente da direção criativa da Louis Vuitton.
Ainda que seja abordado como tema principal no Met Gala de 2025, o afro-dandismo na moda masculina já marcava presença e se destacava em temas de edições anteriores, como nos trajes de Colman Domingo e Alter Manson em 2024 (Sleeping Beauties: Reawakening Fashion), Brian Tyree Henry em 2023 (Karl Lagerfeld: A Line of Beauty), e o saudoso Chadwick Boseman em 2018 (Heavenly Bodies: Fashion and the Catholic Imagination).
É possível esperar por grandes performances visuais de mulheres no tapete vermelho, mesmo que o tema deste ano ano seja focado na moda masculina, afinal, o dândi também pode ser feminino. Pensar o dandismo negro de mulheres é relembrar grandes nomes como Grace Jones, Whitney Houston, Erykah Badu e o grupo Diana Ross & The Supremes. Entre artistas mais atuais, destacam-se Doechii, Solange Knowles, Janelle Monáe, Kelela, Zendaya, entre outras que incorporam o estilo em seus trajes.

Para celebrar a temática do baile, a Vogue reuniu os quatro coanfitriões do evento nas capas da edição de maio, contando com a colaboração de artistas, fotógrafos e estilistas negros de renome para compor uma narrativa visual e simbólica de impacto. Pharrell foi retratado em uma pintura de Henry Taylor, conhecido por seu belíssimo acervo dedicado a figuras negras, enquanto Colman Domingo posou para Iké Udé, cujos retratos vibrantes evocam o dandismo. Já Lewis Hamilton foi fotografado por Malick Bodian e estilizado por Ib Kamara e Eric McNeal, que já havia assinado o styling do piloto no Met Gala 2024. Por fim, A$AP Rocky posou para Tyler Mitchell enquanto Law Roach ficou responsável pelas roupas.
Além disso, junto a GQ, a Vogue criou um portfólio em homenagem a exposição, exaltando o estilo dândi e reunindo mais de 30 personalidades negras de diversas áreas do entretenimento, como o diretor Spike Lee, a atriz Ayo Edebiri e a modelo Anok Yai. Exaltando a elegância negra e a importância da temática para cada um dos participantes de forma simbólica e impactante, a produção desperta expectativas sobre os looks que serão exibidos na tão esperada noite.
O dandismo negro, mais do que uma estética elegante, é uma maneira de resistência e pertencimento. Ao atravessar décadas, ele continua a afirmar a sofisticação negra como expressão de autonomia e criatividade. Superfine: Tailoring Black Style é um tema tão interessante quanto ousado e o que esperamos ver no tapete vermelho, dia 5 de maio, é a exaltação da história e excelência negra. A expectativa para a noite é de trajes elegantes que não apenas vestem, mas contam histórias, projetam identidades e ampliam os horizontes da moda contemporânea. Da alfaiataria sob medida ao estilo autoral de artistas contemporâneos, o dandismo negro segue sendo uma força estética e cultural que desafia normas, resgata memórias e projeta novos futuros para a moda.
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